César foi um trocinho que Deus mandou há 6 meses pra acalantar a vida da gente.
Hoje eu vejo isso claramente, mas houve um tempo em que eu estava cega para César. Eu só via, só pensava, só me preocupava com o tio dele. E é sobre a relação com esse tio, que César viu apenas uma vez, no seu segundo dia de vida, que quero escrever hoje.
Deus, lá de cima, brincando com nossas vidas como comumente o faz, nos mandou César e nos tirou Crístian na mesma época. A notícia da vinda de César chegou aos meus ouvidos dois dias antes do resultado dos exames que atestaram o câncer de seu tio. Ninguém comemorou. Por motivos óbvios, não tínhamos condições emocionais de vibrar por uma vida que chegava. Ao invés disso, chorávamos pela possibilidade de abreviação da vida daquele com quem convivíamos e que tanto amávamos.
Sua mãe foi uma grávida triste. E isso era visível. Passou sua gestação levando o irmão às sessões de quimioterapia, a cada 21 dias, tentando desesperadamente passar o máximo de tempo possível ao lado dele. Quando sua barriga despontou, espantamo-nos: havia mesmo uma vida pulsando ali, ele queria vir, queria fazer parte desse círculo, dessa família, desse amor. Então finalmente a ficha caiu, logo um novo membro da família nasceria, nada mais justo e natural que acolhê-lo com todo amor de que dispúnhamos.
César veio numa linda manhã de verão, com direito a engarrafamento nas proximidades do Rio Vermelho, por conta da festa de Yemanjá. Nasceu lindo. A cara de Bento, só que em tamanho GG.
Nesse dia eu me permiti chorar, emocionada, ao vê-lo através do vidro do centro cirúrgico. Lembrei do dia do meu parto e tive até vontade de ter outro filho (na verdade isso foi quase um surto, que não durou muito, rsrs). Nesse dia eu esqueci um pouco o agravamento da doença de Cristian e me permiti ficar feliz por César e por seus abençoados pais.
A última vez em que meu irmão saiu de casa, antes de internar-se para sair do hospital já sem vida, foi para ir conhecer o sobrinho. Registramos esse dia com fotografias e guardamos lindas lembranças dele, esforçando-se para aparentar um bem estar que já não existia. Dois dias depois foi internado, e no dia em que César completou um mês de vida, seu tio partiu.
Hoje faz seis meses que Deus nos presenteou com César, sabendo que precisaríamos dele para abrandar a dor pela perda de Crístian um mês depois. Foram dias difíceis, mas o tempo passou e ele cresceu e nos mostrou que herdou o sorriso de canto de boca e o levantar de sobrancelha, igualzinho ao do tio.
César nos traz alegrias infinitas, mas às vezes vejo aquele sorriso inocente, aqueles olhos enormes e lembro tanto de meu irmão, que tenho vontade de chorar. Mas não choro, porque César é alegria, e é uma prova de que Deus nos ama muito!